sexta-feira, 11 de fevereiro de 2022

"Que me continua"


 

Essa música, Que me continua, foi apresentada em mais de uma ocasião a trabalhadores da rede de Atenção Básica, em roda de conversa.

Escolhi o formato de móbile pelo movimento a que ele remete. É difícil representar uma música escrita, de modo que desperte o interesse dos participantes em se envolver com o material.

As interpretações que essa música suscita fornecem bons temas de conversa e reflexão em grupo, vencido o estranhamento inicial que seus versos causam... 😊

Particularmente para este post, escolho trazer uma interpretação do trabalhador que remeteu ao trabalho em equipe ao manusear o móbile.

O trabalho em equipe em saúde conta com inúmeras produções, pesquisas, teorias. O aspecto que emergiu para discussão no grupo, na ocasião, foi a autorregulação ou autogestão de que uma equipe de saúde precisa (e é capaz!) para seu funcionamento.

Ainda que no serviço público persista um modelo bastante hierarquizado, com muitas camadas de chefes, diretores, supervisores, gestores, coordenadores e tudo mais, boa parte do cotidiano de trabalho se pauta no “não prescrito”.

Burlar o “prescrito” é inventar respostas no cotidiano para problemas não previstos. É criar soluções não previstas nos protocolos. É lidar com demandas imprevisíveis que o usuário traz. É desviar das muitas faltas e lacunas com as quais o serviço público sofre.

Mas também pode significar perder-se, por vezes. Pode se tornar uma perda de perspectiva em relação ao serviço, ao que são as atribuições do SUS, ao próprio exercício da profissão, ao que a população necessita. E mais...

São muitas as produções científicas sobre o tema. Particularmente, gosto de leituras de Emerson Merhy, Marina Peduzzi e Laura Feuerwerker, que tratam do tema de modo bastante sensível e muito próxima da realidade do trabalho no SUS.

 



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Seguem algumas sugestões de leitura, para quem quiser saber mais:

Trabalho em equipe e prática colaborativa na Atenção Primária à Saúde, autoras: Marina Peduzzi e Heloise Fernandes Agreli [1]

Trabalho em equipe: uma revisita ao conceito e a seus desdobramentos no trabalho interprofissional, autores: Marina Peduzzi, Heloise Lima Fernandes Agreli, Jaqueline Alcântara Marcelino da Silva e Helton Saragor de Souza [2]

Dimensões do trabalho interprofissional e práticas colaborativas desenvolvidas em uma unidade básica de saúde, por equipe de Saúde da Família; autores: Patrícia Escalda e Clélia Maria de Sousa Ferreira Parreira [3]

Rede Básica, campo de forças e micropolítica: implicações para a gestão e cuidado em saúde; autores: Emerson Elias Merhy, Laura Camargo Macruz Feuerwerker, Mara Lisiane de Moraes Santos, Debora Cristina Bertussi e Rossana Staevie Baduy [4]

 

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 Que me continua

 

Se ando cheio, me dilua

Se estou no meio, conclua

Se perco o freio, me obstrua

Se me arruinei, reconstrua

 

Se sou um fruto, me roa

Se viro um muro, me rua

Se te machuco, me doa

Se sou futuro, evolua

 

Você que me continua

Você que me continua

Você que me continua

 

Se eu não crescer, me destrua

Se eu obcecar, me distraia

Se me ganhar, distribua

Se me perder, subtraia

 

Se estou no céu, me abençoe

Se eu sou seu, me possua

Se dou um duro, me sue

Se sou tão puro, polua

 

Você que me continua

Você que me continua

Você que me continua

 

Se sou voraz, me sacie

Se for demais, atenue

Se fico atrás, assobie

Se estou em paz, tumultue

 

Se eu agonio, me alivie

Se me entedio, me dê rua

Se te bloqueio, desvie

Se dou recheio, usufrua

 

Você que me continua

Você que me continua

Você que me continua

 

Você que me continua

Você que me continua

Você que me continua

 

Você que me continua

Você que me continua

Você que me continua

 

Compositores: Arnaldo Antunes / Edgard Scandurra

 

Uma música do álbum A Curva da Cintura, de Arnaldo Antunes, Edgard Scandurra e Toumani Diabaté, lançado em 2011.

 

Para saber mais sobre o álbum, clique aqui

 

Ouça a música AQUI.

 

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[1] https://www.scielo.br/j/icse/a/MR86fMrvpMcJFSR7NNWPbqh/abstract/?lang=pt

[2] https://www.scielo.br/j/tes/a/RLtz36Ng9sNLHknn6hLBQvr/abstract/?lang=pt

[3] https://www.scielo.br/j/icse/a/Kg5M3YCMBKsbkx4QF6DJvJt/abstract/?lang=pt

[4] https://www.scielo.br/j/sdeb/a/RXfnPp73B9Dpcz5pqcVnBdf/abstract/?lang=pt

quarta-feira, 2 de fevereiro de 2022

EPS em Movimento com Emerson Merhy

"Movimentando-se com a EPS" seria também um bom título para este post.

A pista que compartilho hoje se constitui de dois vídeos muito especiais, sobre a EPS em Movimento, de 2014, que estão disponíveis no YouTube.

Estes vídeos fazem parte do material pedagógico de um curso de especialização e aperfeiçoamento em EPS, ofertado pelo Ministério da Saúde, com articulação do Departamento de Gestão da Educação na Saúde (Deges/MS), em parceria com a Universidade Federal do Rio Grande do Sul.

(logotipo do curso - fonte: site da UFRGS)

  

O primeiro vídeo, que tem o nome de EPS em Movimento - Emerson Elias Merhy, pode ser encontrado neste endereço AQUI.

Em pouco mais de 15 minutos, Merhy [1] consegue apresentar de modo muito simples e acessível o que é a EPS em Movimento. O exemplo que ele escolheu para ilustrar e discutir a questão do "movimento" foi uma entrevista do músico e compositor Marcelo Yuka, que integrou O Rappa.

No ano 2000, aos 34 anos de idade, o artista foi vítima de um episódio de violência urbana, sendo baleado durante um assalto, o que fez com que vivesse o restante de sua vida em uma cadeira de rodas. 

No vídeo, Merhy conta que, em 2014, Yuka concedeu uma entrevista à revista Cult, na qual relatou sobre a “perda do sentido da vida”, logo em seguida ao ocorrido. A frase “a imobilidade me movimentou” foi um disparador para que o professor colocasse sob novas perspectiva suas ideias acerca da EPS.

A partir deste ponto do vídeo, aos 5 minutos, Merhy analisa o mundo do trabalho em saúde, compreendido como uma escola neste contexto, em que os trabalhadores são produtores de conhecimento e aprendizes, ao mesmo tempo. Discute o cotidiano deste mundo, suas relações e as dificuldades inerentes a um cenário tão complexo.

Ele nos lembra que o trabalho em saúde sempre é sobre o encontro com o “outro”, que não está totalmente definido. Há uma novidade  neste “outro” e uma tensão natural que pode levar o trabalhador a se proteger na imobilidade.

A EPS surge no seu discurso como uma prática sistemática, que se dá ainda que na imobilidade que o mundo do trabalho nos produz.

Em sua fala, surge também a potência do trabalhador, que se movimenta e produz mobilidade no cotidiano. Dentro de uma regra rígida, por exemplo, é capaz de criar espaços novos, é capaz de invenção. É aí que se produz a novidade, para si e para o “outro”. E então temos novos modos de cuidado.

 

O outro vídeo chama-se EPS em Movimento – depoimento Merhy e pode ser assistido AQUI.

Com duração de 13 minutos, esse material é outra fonte sobre o tema, a que vale bastante assistir.

Merhy discorre sobre o trabalhador em sua formação contínua, sob a forma da EPS, que tem lugar no mundo do trabalho. Faz um contraponto entre esta modalidade e a proposta de uma formação mais estruturada, para aquisição de habilidades e conhecimentos específicos, aprimoramento de uma técnica, por exemplo.

Um ótimo ensejo para discussão EPS x Educação Continuada...

E nos próximos minutos do vídeo, é exatamente o que ele faz, propondo-se a diferenciar EPS e EC.

Educação Continuada: organiza pensamentos já elaborados e estruturados.

Educação Permanente em Saúde: mundo do trabalho exige pensamento sobre o próprio ato.

Ao longo do vídeo, Merhy aprofunda aspectos da EPS, complementando o material apresentado mais acima, nos convidando a reflexões mais provocativas quanto ao tema.

Percebo esse segundo vídeo como um diálogo mais denso sobre a EPS e o mundo do trabalho...

Apesar dos títulos semelhantes e de ter o mesmo protagonista (com a mesma roupa! 😊), os vídeos diferem bastante entre si... O suficiente para que os dois possam ser trabalhados com um mesmo público, tranquilamente.

 

Para complementar essa discussão, sugiro a leitura do artigo Educação Permanente em Movimento - uma política de reconhecimento e cooperação, ativando os encontros do cotidiano no mundo do trabalho em saúde, questões para os gestores, trabalhadores e quem mais quiser se ver nisso.

O autor é... sim, Merhy.

Este artigo de opinião é de 2015 e seu longo título é autoexplicativo. Em compensação, tem apenas 8 páginas, podendo ser trabalhado em um momento de leitura coletiva.

Está disponível clicando AQUI.

 

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[1] Emerson Elias Merhy - quem é

 

Cai o muro do cemitério

Ou Crônica de uma segunda-feira chuvosa   Segunda-feira cinzenta e chuvosa. Umidade. Fazia um pouco de frio. No WhatsApp, estava l...