Essa é uma dimensão da pandemia que nos remete diretamente às
obras de ficção, em que pessoas em “trajes de astronauta” tomavam à frente de
todas as ações e decisões, diante de uma crise envolvendo risco biológico (ou
alienígena!).
Mesmo fora do ambiente hospitalar, essa realidade do uso obrigatório de Equipamentos de Proteção Individual (EPI) para os profissionais de saúde tem impactado nas relações com os colegas e usuários dos serviços.
Como superar a barreira da máscara, touca, avental e possibilitar as trocas afetivas no momento do encontro nos serviços de saúde ou nas casas que visitamos?
Essa pandemia tem nos desafiado a reinventar técnicas, expressões e jeitos, tanto nas relações pessoais como profissionais.
Atuando como psicóloga, no SUS, na Atenção Básica especificamente, continuo trabalhando nas unidades, atuando junto a outros profissionais, dando prosseguimento a atendimentos dos usuários e atendendo novos casos também.
Cotidianamente, está posto o desafio de estabelecer conexões para além dos EPI obrigatórios e essenciais para a segurança de todos.
Com as barreiras impostas pela COVID-19, como compensar o distanciamento que se impõe mesmo no momento do encontro? Essa questão se impôs desde o início da pandemia, com seus impactos nas redes de saúde.
O que nos torna humanos no encontro com o outro? A experiência tem me mostrado que é a presença.
É o estar ali, naquele exato momento, junto com o outro, para além da
mera presença física. Ali e não em outro lugar, em outro tempo, em outra
sintonia. É o conviver com as inseguranças e os medos despertados nestes tempos sombrios, para estar com o outro.
O que nos torna reconhecíveis no momento do encontro? São as palavras? Os silêncios? O olhar? O sorriso? A voz? Os gestos? Um crachá?
Cada ida aos serviços, cada diálogo com outros trabalhadores, cada atendimento, cada visita domiciliar tem sido uma experiência única nos últimos meses. E a cada experiência, venho me permitindo experimentar diferentes modos-de-ser-e-estar com o outro, ainda que sob à sombra da pandemia.
A cada encontro, a voz se modulava diferente, os gestos se tornavam mais eloquentes ou recatados, a risada mais solta ou mais comedida, o corpo de inclinava mais ou menos, ora numa reverência, ora num esquivar.
Expandir. Recolher.
Mas estando sempre ali e não em outro lugar...
Por fim, em meio a esses encontros-experimentações, lembrei do pequeno-grande poema que compartilho a seguir...
Para ser grande, sê inteiro: nada
Teu exagera ou exclui.
Sê todo em cada coisa. Põe quanto és
No mínimo que fazes.
Assim em cada lago a lua toda
Brilha, porque alta vive.
De Ricardo Reis, heterônimo de Fernando Pessoa, publicado em 1933.

Como se deixar contaminar por nestesoutras coisas que não o vírus encontros?
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