quarta-feira, 24 de maio de 2023

Maio - mês da luta antimanicomial

Em 18 de maio, é comemorado o Dia Nacional da Luta Antimanicomial.

O nome pode causar estranheza e tropeços na pronúncia, porém vale a pena um mergulho no tema, que é indissociável do debate sobre Saúde Mental ou Atenção Psicossocial.

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No final da década de 1970, iniciou-se o movimento da Reforma Psiquiátrica, coincidindo com o final da ditadura civil-militar. Em 1987, aconteceram dois eventos importantes para a escolha do dia que simboliza essa luta, o Encontro de Trabalhadores da Saúde Mental, em Bauru/SP, e a I Conferência Nacional de Saúde Mental, em Brasília. Em 2001, foi aprovada a lei nº 10.219, instituindo a Reforma Psiquiátrica.

Mas o que significa isso?

A partir da lei da Reforma Psiquiátrica, houve um redirecionamento do modelo assistencial em saúde mental no país. Começava a extinção do cuidado em saúde mental com a privação de liberdade em leitos de hospitais psiquiátricos e manicômios. Passava a ser prioridade o tratamento em liberdade, em serviços de "porta aberta", com vivência comunitária e próximos ao local de moradia da pessoa. 

Não se admitiria mais discriminação e exclusão de pessoas com sofrimento em saúde mental de nossa sociedade, da convivência familiar e comunitária, dos espaços públicos.

E a luta antimanicomial, o que é afinal?

O Movimento Antimanicomial se propõe a lutar pelos direitos das pessoas com sofrimento mental. Um dos principais objetivos é o combate ao estigma / preconceito e à exclusão de pessoas com sofrimento psíquico grave. O Movimento Antimanicomial defende o direito fundamental à liberdade, o direito a viver em sociedade, além do direito a receber cuidado e tratamento, sem diminuir seu potencial para o exercício da cidadania.

E onde se busca ajuda hoje em dia?

A Unidade Básica de Saúde ou Unidade de Saúde da Família pode ser um bom começo. Elas são a porta de entrada do SUS, exceto em casos de muita gravidade. 

Temos também os Centros de Atenção Psicossocial, chamados de CAPS, que podem atender essa demanda.

E contamos com as Unidades de Pronto Atendimento, conhecidas como UPA, para casos de muita gravidade, em que haja risco de dano grave ou morte para a pessoa.

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O texto acima foi elaborado para um mural informativo em uma Unidade de Saúde da Família. A intenção era deixar a leitura compreensível para o diálogo com a população.

No grupo de saúde mental mensal da unidade, este foi o tema do encontro de maio.

Como disparador do encontro, utilizamos um vídeo do Brasil de Fato, chamado  Luta Antimanicomial: o que é e qual o cenário atual do Brasil? 

Esse vídeo é curto, com pouco mais de 5 minutos de duração, de linguagem acessível e muitas imagens ilustrativas.

Por estar em Santos (São Paulo), é impossível dissociar a experssão "antimanicomial" e a instituição denominada Casa de Saúde Anchieta. Logo no início do diálogo com o grupo, uma participante se manifestou, referindo que um parente próximo, já falecido, foi interno lá. Muitos moradores da cidade têm ou tiveram suas histórias de vida atravessadas por esta instituição, de maneira muito negativa.

A história deste lugar e sua desativação merece ser conhecida. Uma boa fonte para iniciar é o artigo Saúde Mental e a Antipsiquiatria em Santos: vinte anos depois, do Professor Doutor Roberto Tykanori Kinoshita. E daí em diante, existe farto material disponível on-line e gratuito.

Voltando ao encontro do grupo, após a exibição do vídeo, enquanto dialogávamos, estavam espalhadas na mesa cartolinas coloridas, com frases disparadoras sobre normalidade, loucura, lou(cura) e liberdade. Também estavam disponíveis canetas hidrográficas, lápis de cor, giz de cera, tinta guache e materiais de colagem. A atividade era de expressão livre.

Enquanto os participantes escreviam ou se ajudavam na incursão no mundo das letras, um diálogo muito interessante ia se passando, revelando diversas concepções, percepções, preconceitos, sofrimentos, frustrações, suscitados pelas palavras 'normalidade' e 'loucura'.

Dar voz a esses pensamentos / sentimentos, compartilhando pequenos trechos de vida, foi o mais potente neste encontro.

Registros...

 



 

As cartolinas foram coladas pelas paredes da unidade, para manter em movimento, ao longo das semanas de maio, o tema da luta antimanicomial. 

quarta-feira, 10 de maio de 2023

Colar e Não Pirar

Pequeno relato sobre o uso de colagem em um grupo de saúde mental para adultos, em uma Unidade de Saúde da Família.

A importância da arte como uma proposta terapêutica não é novidade. Tem até nome: ARTETERAPIA 📌.

Embora haja bastante estudos e publicações científicas sobre a Arteterapia,  continua sendo válido lembrar que ela pode ser um instrumento de trabalho na Psicologia. 

Para elaborar a proposta deste encontro, escolhi a COLAGEM, dentre outras técnicas artísticas, por considerar uma atividade muito gratificante e por ser muito acessível e inclusiva.

Particularmente, faço colagem há tempos, por gosto pessoal mesmo. (Mas daí é outra história... 😉).

A colagem (ou collage), por mais lúdica que seja, também já foi estudada como técnica artística e terapêutica. Muitos artistas importantes têm seu nome relacionado a esta expressão artística, tais como Dadá, Picasso e outros nomes ligados ao movimento surrealista.

Mas, voltando à atividade em si. Foi uma proposta em formato de oficina, que chamei de "Colar e Não Pirar". 

 


A ideia era reunir os participantes em torno de uma grande mesa, tendo à mão muito material para criar "artes" - papel sulfite, revistas, tesouras, cola. 

Apesar do enfoque em colagem, pedi ao grupo envolvido na organização da atividade que reunisse também materiais de pintura diversos: giz, canetas hidrográficas, lápis de cor, tinta guache, pinceis, barbante.

 





Ao procurar referências bibliográficas para este post, descobri essa frase:

"Se são as plumas que fazem a plumagem, não é a cola que faz a colagem." (Max Ernst - artista surrealista)

Essa frase me fez pensar que a atividade de colagem pode e deve extrapolar em possibilidades.

Por ser uma atividade artística, manual, de livre formato, foi fácil envolver os participantes. Os diálogos em torno da mesa foram o ponto alto do encontro. As pessoas criando, livremente, suas obras de arte, se expressando em diversas formas, interagindo...

 

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Você sabia que existe a Sociedade Brasileira de Colagem?

 

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Leituras que me inspiraram:

Collage: a colagem surrealista 

Colagem: investigação em torno de uma técnica moderna


Mês da Mulher: histórias que inspiram

Não tem jeito, mês de março, todo ano, pede ações / intervenções / invenções centradas nas mulheres.

E a escolha deste ano foi por valorizar a história das nossas mulheres, as trabalhadoras da unidade e as usuárias atendidas.

Pedimos que as mulheres compartilhassem pequenos trechos de sua vida, o que desejassem. Ou também que escrevessem um pouco sobre curiosidades que gostariam que as outras soubessem sobre si. Não havia necessidade de se identificar. 

Da ideia singela de utilizar papeis coloridos e/ou enfeitados, desembocamos na caprichosa sugestão de "papel de carta", proposta por uma das integrantes que efetiva o grupo.

As narrativas foram sendo escritas, coletadas e expostas em mural / varal. No dia do encontro, lemos cada contribuição e dialogamos sobre as pequenas e grandes revelações ali registradas.

 

 

Cada história individual se tornava coletiva ao ser lida, pois os pontos de identificação eram muitos. 

Circular a palavra entre mulheres também tem uma beleza muito particular, ainda mais no contexto da saúde, da saúde pública em especial.

 

Cai o muro do cemitério

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